A celebração do termo de compromisso em matéria ambiental

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Por Talden Farias*

Com o objetivo de permitir a regularização daquelas atividades das quais se exige o licenciamento ambiental, mas que não o fizeram, a Medida Provisória 2.163-41/01 modificou a Lei 9.605/98 (Lei dos Crimes e das Infrações Administrativas Ambientais) criando o termo de compromisso, que é o instrumento por meio do qual é celebrado um acordo entre os órgãos que fazem parte do Sisnama e o responsável pela atividade utilizadora de recursos ambientais ou capazes de causar impactos ao meio ambiente, tendo o intuito de evitar ou suspender as sanções administrativas[1]. Por meio desse instrumento, o órgão ambiental exige as adequações e correções necessárias, comprometendo-se o empreendedor a efetuá-las dentro de um cronograma determinado, de maneira que a atividade possa voltar a funcionar.

É importante destacar que esse instrumento somente poderá ser aplicado em relação às atividades que puderem se adequar à legislação, já que existem empreendimentos em que as irregularidades são tantas e de tamanha monta que em hipótese alguma poderiam ser regularizados[2]. De acordo com Daniel Roberto Fink e André Camargo Horta de Macedo[3], trata-se de um título executivo extrajudicial capaz de suspender a aplicação e a execução das sanções administrativas por um período de 90 dias até três anos, a contar da data do requerimento, podendo ser prorrogável por igual período.

Se por um lado o termo de compromisso objetiva adequar os empreendimentos às exigências ambientais necessárias, devendo constar uma descrição detalhada tanto das obras e serviços a serem executados como das metas trimestrais a serem atingidas, por outro lado o documento deve prever a multa ou alguma outra forma de penalidade administrativa para o caso de descumprimento total ou parcial. Somente se ressalvando o caso fortuito ou de força maior, no caso de descumprimento de suas cláusulas o termo de compromisso estará rescindido de pleno direito, de maneira que as multas e outras penalidades administrativas previstas poderão ser executadas imediatamente[4]. Cuida-se de um mecanismo de promoção do chamado licenciamento ambiental de regularização, assunto que já foi objeto de outro texto.

Com a sua celebração, normalmente ficam suspensas as sanções administrativas impostas aos empreendedores que tiverem como causas fatos contemplados no acordo firmado[5]. Se o empreendedor cumpre na íntegra as cláusulas do documento, inclusive no que diz respeito ao prazo, aquelas sanções administrativas que deram origem ao acordo deixam de estar suspensas e passam a ser nulas, a não ser que o próprio acordo disponha de forma diferente.

O termo de compromisso poderá ser utilizado em relação às atividades em instalação, atividades já instaladas ou atividades em funcionamento, devendo o órgão ambiental competente analisar as peculiaridades de caso específico para poder viabilizar a sua regularização. Nesses casos, a licença prévia e mesmo a licença de instalação não poderão ser emitidas, devendo a licença de operação tentar suprir o papel daquelas, na medida do possível. Também é preciso levar em conta os seus requisitos formais, que, segundo Margareth Michels Bilhalva[6], são em geral os de qualquer instrumento contratual, a exemplo da descrição das partes, prazo de validade, descrição detalhada do objeto etc.[7].

É importante destacar que o mecanismo só pode versar sobre infrações administrativas, não podendo ter nenhuma relação direta com a eventual criminalização da conduta lesiva ao meio ambiente ou a sua reparação na esfera cível. É o caso, por exemplo, do empreendedor que ao celebrar o instrumento se beneficia com a suspensão da multa administrativa aplicada em decorrência da ausência da licença. Após as alterações do Decreto 9.179/2017, o Decreto 6.514/08 passou a prever o termo de compromisso como instrumento para formalizar a conversão do valor da multa em prestação de serviços ambientais, o que regulamentou o parágrafo 4º do artigo 72 da Lei 9.605/98 (assunto esse que já foi tratado aqui).

Trata-se de um instrumento que não pode versar diretamente sobre a responsabilidade civil e criminal, posto que diz respeito à responsabilidade administrativa, ainda que possa gerar efeitos em tais esferas jurídicas. Sendo assim, o termo de compromisso é um instrumento que permite às atividades potencial ou efetivamente poluidoras se regularizarem perante o órgão ambiental, quando houver margem legal para que isso aconteça. Com as alterações impostas pela Lei 13.655/2018, o Decreto-Lei 4.657/42 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) passou a servir para fundamentar a temática também[8]. Isso fez com que o limite temporal previsto no parágrafo 2º do artigo 79-A da Lei 9.605/98 pudesse deixar de ser observado, embora na prática tal coisa já fosse frequente no cotidiano dos órgãos ambientais.

Impende dizer, a título de esclarecimento, que o termo de compromisso segue a mesma sistemática do termo de ajustamento de conduta (TAC), o qual está previsto no parágrafo 6º do artigo 5º da Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), determinando que “os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial”. Do rol de legitimados para propor ação civil pública, apenas as associações civis constituídas legalmente para a defesa de interesses de natureza transindividual e as fundações privadas não podem celebrar o TAC.

Ou seja, estão legitimados para tal o Ministério Público, a Defensoria Pública, a União, os estados, o Distrito Federal, os municípios, as autarquias, as empresas públicas, as fundações públicas, as sociedades de economia mista e os órgãos da administração pública sem personalidade jurídica destinados especificamente à defesa dos interesses e direitos referidos, conforme dispõem os incisos I, II, III e IV da Lei de Ação Civil Pública e o inciso III do artigo 113 da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor). Na prática, a única diferença entre um e outro é que no termo de compromisso os legitimados são os órgãos integrantes do Sisnama, que são as autarquias, fundações públicas e órgãos da administração pública direta que trabalhem diretamente com a questão ambiental — os quais também podem celebrar o TAC, é importante frisar.

[1] FINK, Daniel Roberto; MACEDO, André Camargo Horta de. Roteiro para licenciamento ambiental e outras considerações. In: FINK, Daniel Roberto; ALONSO JÚNIOR, Hamilton; DAWALIBI, Marcelo (Org.). Aspectos jurídicos do licenciamento ambiental. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 26.
[2] BRASIL. Cartilha de licenciamento ambiental. Brasília: Tribunal de Contas da União, Secretaria de Fiscalização de Obras e Patrimônio da União, 2004, p. 25.
[3] FINK, Daniel Roberto; MACEDO, André Camargo Horta de. Roteiro para licenciamento ambiental e outras considerações. In: FINK, Daniel Roberto; ALONSO JÚNIOR, Hamilton; DAWALIBI, Marcelo (Org.). Aspectos jurídicos do licenciamento ambiental. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 26.
[4] FINK, Daniel Roberto; MACEDO, André Camargo Horta de. Roteiro para licenciamento ambiental e outras considerações. In: FINK, Daniel Roberto; ALONSO JÚNIOR, Hamilton; DAWALIBI, Marcelo (Org.). Aspectos jurídicos do licenciamento ambiental. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 27.
[5] BRASIL. Cartilha de licenciamento ambiental. Brasília: Tribunal de Contas da União, Secretaria de Fiscalização de Obras e Patrimônio da União, 2004, p. 25.
[6] BILHALVA, Margareth Michels. Questões práticas para celebração de TAC e TC em matéria ambiental. In: QUERUBINI, Albenir; BURMANN, Alexandre, ANTUNES, Paulo de Bessa (orgs). Direito Ambiental os 30 anos da Constituição de 1988. Londrina: Thoth, 2018, p. 377.
[7] Art. 79-A. Para o cumprimento do disposto nesta Lei, os órgãos ambientais integrantes do SISNAMA, responsáveis pela execução de programas e projetos e pelo controle e fiscalização dos estabelecimentos e das atividades suscetíveis de degradarem a qualidade ambiental, ficam autorizados a celebrar, com força de título executivo extrajudicial, termo de compromisso com pessoas físicas ou jurídicas responsáveis pela construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores.§ 1º O termo de compromisso a que se refere este artigo destinar-se-á, exclusivamente, a permitir que as pessoas físicas e jurídicas mencionadas no caput possam promover as necessárias correções de suas atividades, para o atendimento das exigências impostas pelas autoridades ambientais competentes, sendo obrigatório que o respectivo instrumento disponha sobre: I – o nome, a qualificação e o endereço das partes compromissadas e dos respectivos representantes legais; II – o prazo de vigência do compromisso, que, em função da complexidade das obrigações nele fixadas, poderá variar entre o mínimo de noventa dias e o máximo de três anos, com possibilidade de prorrogação por igual período; III – a descrição detalhada de seu objeto, o valor do investimento previsto e o cronograma físico de execução e de implantação das obras e serviços exigidos, com metas trimestrais a serem atingidas; IV – as multas que podem ser aplicadas à pessoa física ou jurídica compromissada e os casos de rescisão, em decorrência do não-cumprimento das obrigações nele pactuadas; V – o valor da multa de que trata o inciso IV não poderá ser superior ao valor do investimento previsto; VI – o foro competente para dirimir litígios entre as partes.
[8] “Art. 26. Para eliminar irregularidade, incerteza jurídica ou situação contenciosa na aplicação do direito público, inclusive no caso de expedição de licença, a autoridade administrativa poderá, após oitiva do órgão jurídico e, quando for o caso, após realização de consulta pública, e presentes razões de relevante interesse geral, celebrar compromisso com os interessados, observada a legislação aplicável, o qual só produzirá efeitos a partir de sua publicação oficial. §1º O compromisso referido no caput deste artigo: I – buscará solução jurídica proporcional, equânime, eficiente e compatível com os interesses gerais; II – (VETADO); III – não poderá conferir desoneração permanente de dever ou condicionamento de direito reconhecidos por orientação geral; IV – deverá prever com clareza as obrigações das partes, o prazo para seu cumprimento e as sanções aplicáveis em caso de descumprimento.
Art. 27. A decisão do processo, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, poderá impor compensação por benefícios indevidos ou prejuízos anormais ou injustos resultantes do processo ou da conduta dos envolvidos. §1º A decisão sobre a compensação será motivada, ouvidas previamente as partes sobre seu cabimento, sua forma e, se for o caso, seu valor. §2º Para prevenir ou regular a compensação, poderá ser celebrado compromisso processual entre os envolvidos.”

 

*Talden Farias é advogado e professor de Direito Ambiental da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), doutor em Direito da Cidade pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), doutor em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e mestre em Ciências Jurídicas pela UFPB. Autor do livro “Licenciamento ambiental: aspectos teóricos e práticos” (7. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2019).

F0nte: Conjur 

 


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