A Indispensável Compliance na Transição para o Imposto sobre Bens e Serviços

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Por Fábio Pugliesi*

Neste artigo analisar-se-ão as disposições relativas à transição para a instituição do Imposto de Bens e Serviços (IBS), constantes na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n. 45/19, aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados (CCJ) para destacar os aspectos que interessam às empresas e profissionais liberais, bem como as exigências da gestão tributária ou, como se tem denominado, as boas práticas para a compatibilidade com as leis, “compliance tributária”.

Proposta de Emenda Constitucional cria o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) não cumulativo e sem outorga de isenções que substituirá: Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS); Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS); Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins); e Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS).

Embora dependa da aprovação dos plenários da Câmara e do Senado, encontra-se amadurecida a criação do IBS em vista do relatório da PEC n. 293/04 efetuado pela Comissão Especial da Reforma Tributária da Câmara, que contou com a histórica atuação do relator o então Deputado Luiz Carlos Hauly.

A PEC n. 45/19 estabelece que, em dez anos, as operações interestaduais e intermunicipais, aplicar-se-ão, em linhas gerais, as alíquotas do Estado e do Município de destino, incluídas na soma com a alíquota da União. Assim as parcelas estadual e municipal do IBS passam a pertencer ao Estado e Município de domicílio do destinatário final e adotadas suas leis.

Nos primeiros dois anos, já chamado “período de teste”, o que deverá implicar diversos debates e propostas de mudança na Emenda à Constituição e leis, dada a reforma no sistema tributário pretendida, o IBS será cobrado à alíquota de 1%, sendo compensado pela redução das alíquotas da Cofins e receita do IBS destinada à Seguridade Social, segundo demonstra a experiência principalmente para as ações de Saúde e Assistência Social.

Nos oitos anos seguintes, as alíquotas dos tributos em extinção devem ser reduzidas, compensando-se o incremento das alíquotas do IBS por meio de leis federais, estaduais e municipais. Tais alíquotas do IBS serão fixadas pelo Senado Federal, baseado em estudos do Tribunal de Contas da União e mantida “constante a carga tributária”, considerando as disposições relativas à desvinculação de receitas da União (DRU).

Assim, se um Estado ou município tencionar diminuir alíquota do IBS haverá formas para punir o uso de tais práticas e a justiça fiscal dar-se-á, em linhas gerais, por meio do cpf do consumidor de baixa renda, o que visa reprimir os crimes contra a ordem tributária e lavagem de dinheiro.

Evidentemente poderão haver litígios entre os entes federativos, mas vislumbro um crescente papel do Ministério Público depois da Lei complementar n. 157/16 para coibir isto. Nossa experiência permite destacar o empenho do Ministério Público de Santa Catarina por intermédio do Centro de Apoio Operacional de Defesa da Ordem Tributária (COT/MPSC).

Parece-me longo um período de transição de dez anos. A experiência demonstra que o prazo de cinco anos, fixado pela Emenda à Constituição (EC) n. 87/15, tem sido bem sucedido para a apuração e o recolhimento do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS) na mudança na tributação quando o contribuinte destina bens e serviços para consumidor final em outro Estado. Observado que o contribuinte deve adotar a alíquota interestadual do ICMS e cabe ao Estado de localização do destinatário o ICMS correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual.

As tecnologias de informação, que deverão ser exponencialmente mais acessíveis e baratas ao longo do período de transição, corroboram a viabilidade do período para cinco anos.

Afinal a plataforma www.interlegis.gov.br já permite o acesso às legislações dos Estados, Distrito Federal e de centenas de Municípios sem custos, confiabilidade e uso cada vez mais amigável.

Por outro lado, se nossa privacidade e intimidade acabam sendo compartilhadas por meio das redes sociais, vislumbra-se um incremento das técnicas de big data e Inteligência Artificial (IA) durante o período de transição que poderão ser utilizada facilmente pela Fazenda Pública para apurar a compatibilidade das empresas com as normas tributárias, inclusive as destinadas ao controle da arrecadação. Reitero que a PEC n. 45/19 atribui ao Senado Federal a observância da carga tributária no país.

Embora a PEC n. 45/19 vede a concessão de isenções e outros incentivos fiscais para o IBS, é certo que, no período de transição, devem ser consideradas as possibilidades de redução ou adiamento dos tributos atualmente existentes por meio de ações judiciais e procedimentos perante a Administração, bem como a extinção, a decadência e a prescrição do crédito tributário.

Neste processo não se admite a prática infratora por meio da qual se busca ocultar a ocorrência do fato gerador, objetivando reduzir ou não pagar o tributo, aliás inútil se considerarmos as intimidades e privacidades que tendem ser cada vez mais compartilhadas.

A possibilidade das autoridades administrativas desconsiderarem atos ou negócios jurídicos com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador, segundo o parágrafo único do artigo 116 do CTN, tende a reafirmar, ainda mais, em vista da crescente facilidade de verificar se os documentos correspondem aos fatos.

Desta forma um fato que se enquadre em abuso pode dar-se em uma situação e não ocorre em outra, exigindo uma análise caso a caso, o que reafirma a necessidade dos procedimentos empresariais terem uma efetiva e eficiência compatibilização com a legislação tributária, o que em síntese consiste a própria COMPLIANCE TRIBUTÁRIA.

Assim a atuação do advogado se insere em uma atuação multidisciplinar em que o especialista de cada área deve reconhecer a outra para apoiar a busca do resultado buscado pela empresa no âmbito da gestão tributária, observadas as boas práticas de compatibilidade com a legislação tributária.

Agradeço a interlocução do Caríssimo Desembargador Aposentado Mestre Anselmo Cerello durante a elaboração deste artigo.”

 

fábiopugliesi*Fábio Pugliesi é advogado em São Paulo e Santa Catarina. Membro do Instituto dos Advogados do Estado de Santa Catarina (IASC). Doutor em Direito, Estado e Sociedade (UFSC), Mestre em Direito Financeiro e Econômico (USP), Especializado em Administração (FGV-SP), autor do livro “Contribuinte e Administração Tributária na Globalização” (Juruá) e professor em cursos de graduação e pós-graduação.

 

 

 

Fonte: http://conversandocomoprofessor.com.br/2019/06/02/a-indispensavel-compliance-na-transicao-para-o-imposto-sobre-bens-e-servicos/

 


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