Arquipélago de Alcatrazes agora é Unidade de Conservação

Medida põe fim à guerra entre Marinha do Brasil e Ambientalistas

Arquipélago de Alcatrazes, litoral de SP

Arquipélago de Alcatrazes, litoral de SP

 

Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro

O Arquipélago de Alcatrazes, por mais de trinta anos, foi o centro de uma guerra, que gerou processos na justiça militar contra ambientalistas e muita polêmica com a Marinha de Guerra do Brasil.

Tiros e preservação

Utilizado como ponto de exercício de tiros da Força Naval do Brasil, desde o século XIX, o arquipélago de Alcatrazes, no litoral norte de São Paulo, município de São Sebastião, paradoxalmente, sempre foi um dos mais preservados em todo o litoral brasileiro.

Porém, durante um período de cerca de 30 anos, a Marinha do Brasil foi acusada de realizar em Alcatrazes, exercícios de guerra com tiros de obuses. Foi nesse período que biólogos acusaram sério risco à biodiversidade das ilhas.

Para se ter uma ideia, das contradições entre versões e fatos, os atobás – pássaros magníficos de nosso litoral, sempre fizeram ninhos na base da lage utilizada como alvo dos tiros da Marinha. A própria Marinha, por conta disso, vinha utilizando carga preenchida com areia, visando não causar danos à área.

O problema é que não apenas grupos ambientalistas, mas partidos e organizações esquerdistas, viram na luta em prol do arquipélago uma boa chance de hostilizar as forças armadas. Com isso, o espectro do debate tomou rumos para muito além da racionalidade.

Nos últimos anos, porém, a tecnologia bélica não mais justificava a manutenção do arquipélago como campo de tiro fixo. O fato permitiu à Marinha ceder à demanda ambiental. Os exercícios foram encerrados definitivamente em 2013 e algumas das áreas afetadas começaram a ser recuperadas.

Desde então passou a ser administrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio, como Estação Ecológica Federal.

Parque ou Refúgio?

Agora, o arquipélago de Alcatrazes passa a ser a mais nova unidade de conservação (UC) federal.

O decreto foi assinado pelo presidente Michel Temer no último dia 02 de agosto, instituindo o Refúgio de Vida Silvestre (RVS) do Arquipélago de Alcatrazes.

A importância não apenas biológica, mas também paisagística do arquipélago é histórica. Desde o início da colonização brasileira o local também era utilizado pelos navegadores como orientação para suas rotas e também, como fuga das tempestades. Porém, ao invés de desembarcar, os visitantes preferiam observar a beleza das formas das ilhas de suas embarcações, até retomarem a viagem.

De acordo com o Ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, a transformação do arquipélago em UC, significa um grande avanço principalmente para o bioma marinho. O local também é área de ocorrência de espécies ameaçadas e endêmicas, como Elecatinus figaro (peixe), Scinax alcatraz (anfíbio) e Bothrops alcatraz (réptil), constantes do Livro Vermelho de Espécies Ameaçadas de Extinção do Ministério do Meio Ambiente, e invertebrados marinhos raros e em risco de desaparecer.

As ilhas de Alcatrazes servem como área para alimentação, reprodução e abrigo para diversos animais e, a criação do Santuário conciliará a preservação da biodiversidade com a soberania nacional, já que ainda se trata de área estratégica para a Marinha Brasileira.

Após anos de rusgas nos governos FHC e Lula, a Ministra Izabella Teixeira, no início do mandato de Dilma Rousseff, articulou-se com o Ministério da Defesa. Então, ambos os ministros solicitaram o apoio dos militares para a criação da nova unidade de conservação já que os dois ministérios contavam com o apoio da Comissão Interministerial dos Recursos do Mar (CCRM), coordenada pela Marinha.

Foi então realizada uma consulta pública em 30 de março de 2011 na cidade de São Sebastião, para a criação de um Parque Nacional Marinho, em virtude do interesse local na visitação e utilização do arquipélago para atividades de mergulho.

Porém, após tratativas com a Marinha do Brasil, a proposta do parque foi alterada para a instituição de um Refúgio de Vida Silvestre. Assim, ampliaram a área de restrição para cerca de 67 mil hectares, aumentando em três vezes a área protegida.

A alteração gerou polêmica. Instituir um “refúgio” significa perder todo o potencial turístico que poderia ser explorado com a instituição de um parque no arquipélago. As atividades de mergulhos praticamente desaparecerão e mesmo a contemplação centenária de navegadores ficará restrita.

Há quem tenha visto na ação do ICMBio pura teimosia biocentrista radical. A moda, ao que parece é restringir ao máximo o uso da área a ser preservada, para não ter trabalho em administrar o uso social e econômico sustentável – exigido para um Parque Nacional.

O ICMBio contesta. Reafirma que a medida não obstrui essas atividades e atrairáo turismo de mergulho, significando maior renda para os moradores da região.

Medida pacifica o conflito

O decreto presidencial, por outro lado, pacifica uma outra zona de conflitos: a das ações judiciais e inquéritos civis públicos promovidos por promotores, procuradores e entidades ambientalistas.

Instituída a UC, não haverá mais razão para hostilização à Marinha, e sem prejuízo da manutenção da área como de interesse militar estratégico, o arquipélago poderá cumprir sua função ecológica.

De todo modo, a aquisição do arquipélago para o sistema nacional de unidades de conservação é um ganho para a gestão ambiental no Brasil.

 

Fontes:
Assessoria de Comunicação do ICMBio e Assessoria de Comunicação Social (Ascom/MMA)

http://www.mma.gov.br/index.php/comunicacao/agencia-informma?view=blog&id=1757

http://www.brasil.gov.br/meio-ambiente/2016/08/arquipelago-dos-alcatrazes-e-a-mais-nova-unidade-de-conservacao-do-pais

 

 

afpp3Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados, integra o Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB, membro da Comissão de Infraestrutura e Sustentabilidade e da Comissão de Política Criminal e Penitenciária da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo (OAB/SP). Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal. Responde pelo blog The Eagle View.

 

 

 

.


Desenvolvido por Jotac