O Plano de Ação governamental para produção e consumo sustentáveis

Por Bruno Andrioli Galvão

Após a aprovação e sanção da Política Nacional de Resíduos Sólidos, que visa remodelar a forma de produção brasileira mediante preocupações de ecoeficiência e sustentabilidade, o Governo apresenta suas mais novas propostas voltadas a produção e consumo. Por meio do Ministério do Meio Ambiente, acaba de ser lançado à consulta pública o Plano de Ação para Produção e Consumo Sustentáveis, o PPCS.

A preocupação com a produção e o consumo sustentáveis não é particularidade brasileira, inserindo-se em um movimento mundial, articulado pelo chamado Processo de Marrakech, coordenado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pelo Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas (UNDESA), programa que é um dos braços do Plano de Johanesburgo, aprovado na Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável/Rio+10, em 2002, que propôs a elaboração de um conjunto de programas que discutam mudanças nos padrões de consumo e produção.

Seguindo a atuação integrada do Processo de Marrakech, e permeado do conceito de responsabilidade compartilhada, o PPCS busca fomentar uma articulação de todos os setores da sociedade, sendo, inclusive, fruto deste trabalho conjunto, com vistas a congregar ações já existentes e outras a serem implementadas com foco em seis grandes preocupações: aumento da reciclagem; educação para o consumo sustentável; agenda ambiental na administração pública; compras públicas sustentáveis; construções sustentáveis; varejo e consumo sustentáveis.

Seu grande objetivo é repensar a forma de produção e os costumes de consumo da sociedade, de forma a entender a necessidade de se incorporar ao longo do ciclo de vida dos bens e serviços as melhores alternativas para minimizar os impactos ambientais e sociais, além de modificar a cultura do consumo, mediante práticas de consumo consciente e necessário. Os problemas hoje conhecidos com a produção despreocupada com os impactos aos recursos naturais e a capacidade de absorção do meio ambiente criam o imperativo de se repensar toda a cadeia de produção, com enfoque, necessariamente, no peso e importância do consumo sustentável.

Assim, o objeto do PPCS é abordar de maneira integrada a produção e consumo, com vistas à sustentabilidade, e não apenas com o antigo enfoque que se sempre se deu apenas aos processos de produção. Torna-se nítido que há uma interdependência entre as duas pontas da cadeia, em que a produção cria a ânsia do consumo e este, por sua vez, pode influenciar as decisões do setor produtivo por meio de boicotes a produtos poluentes, por exemplo.

Neste contexto, o PPCS anuncia, nas seis grandes preocupações já apontadas, alguns projetos que merecem destaque, afora o extenso e infindável imbróglio de projetos que se resumem a indicar suas boas intenções. É o caso do varejo e consumo sustentáveis, sobre o qual de concreto o Programa apresenta apenas o enfoque no setor supermercadista, sem apontar qualquer ação específica, somente indicando a necessidade de percepção do setor de inserção de práticas de sustentabilidade.

Na agenda ambiental na Administração Pública – A3P, entretanto, anunciam-se importantes modificações no comportamento do Estado, grande exemplo à mudança de costumes de consumo, já que 10 a 15% do PIB são utilizados somente com compras da União. Sua meta é incorporar na gestão pública noções socioambientais, com estímulos à redução do consumo governamental de água, energia, papel e demais insumos, além do estímulo ao retrofit sustentável, prática mediante a qual se reforma edificações com o uso de madeira certificada, lâmpadas mais eficientes, novos sistemas de ar condicionado, construção de calhas para coleta de água de chuva, adoção de torneiras automáticas e outras medidas semelhantes.

Outro enfoque do PPCS, intimamente ligado à A3P, é a necessidade de compras públicas sustentáveis, com o incentivo à economia verde ou de baixo carbono desde o estabelecimento de leis, criação ou supressão de tributos específicos, e oferecimento de subsídios a produtos reciclados e recicláveis. Um importante passo neste sentido foi a edição de regramentos que estipulam a adoção de critérios adicionais na aquisição de bens e serviços que não apenas a qualidade e o preço, com prioridade a bens e serviços sustentáveis.

Por fim, outro grande importante aspecto do PPCS é o incentivo ao aumento da reciclagem de resíduos sólidos, em correlação à Política Nacional de Resíduos Sólidos e mediante os princípios da responsabilidade compartilhada dos geradores de resíduos e da logística reversa.

Três são os elementos que devem ser destacados das bonitas palavras governamentais. O fato de o valor potencial a ser alcançado com a otimização da reciclagem ser da ordem R$ 8 bilhões, o que denuncia o enorme mercado que está sendo incentivado pelo Governo. A anunciação de que o CONAMA está prestes a aprovar duas novas resoluções com alto impacto no sistema produtivo, dispondo sobre o descarte e destinação corretos de eletroeletrônicos e das lâmpadas de sódio e vapor de mercúrio. E, a grande novidade em relação à Política Nacional de Resíduos Sólidos, com a singela inclusão das embalagens metálicas, plásticas e de vidro dentre os fluxos de resíduos que terão a obrigação de implantar a logística reversa.

Em menos de três meses o Governo nos saudou com dois importantes textos, que trarão profundos e importantes impactos, seja na cultura de consumo, seja na forma de produção. Mas novamente o setor privado se postou passivamente, sem que houvesse uma articulação forte durante o processo de desenvolvimento deste Plano de Ação. Resta agora ao setor simplesmente dar suas sugestões e tecer críticas a algo já inteiramente desenvolvido.

O pior é perceber essa mesma passividade do setor produtivo quanto ao decreto regulamentador da Política Nacional de Resíduos Sólidos, vez que parece não estar atento, ou mesmo preocupado, desde já, com as conseqüências sabidas e ressabidas desta lei. Não há, por exemplo, qualquer atividade de elaboração de estudos técnicos/jurídicos voltados à elaboração de proposta de um acordo setorial. Talvez esse assunto comece apenas a fazer parte da sua pauta de discussão quando do início do prazo para entrega de uma proposta ao Governo. Resta saber se haverá tempo hábil para que se faça uma articulação eficaz.


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