O PROBLEMA DO PODER CONFERIDO A GENTE COM PROBLEMA

Agora não se pode mais comer carne às segundas…

 

churras-de-papelão

 

Por Antonio Fernando Pinheiro Pedro

Acabou o virado à paulista, o prato comercial mais tradicional servido ás segundas feiras em São Paulo. “Iluminados” decidiram, agora, que a linguiça e a bisteca servidos com arroz, ovo, feijão e couve… é infração administrativa, punida com multa, no primeiro dia útil da semana.

Em verdade, a lei aprovada pelo legislativo paulista decorre da necessidade que muitos têm… de interferir na vida alheia. É o ápice de um regime político comandado por “gente com problema”.

Quando gente com problema… era apenas gente com problema.

Quando eu era jovem, tipos extremamente arrogantes ou humildes, muito agressivos ou muito covardes, excessivamente lascivos ou puritanos, invejosos ou soberbos, exageradamente introvertidos ou extrovertidos, intrometidos ou donos da verdade, eram vistos com reserva, porque “tinham problema”…

Havia também aquela gente que trazia na testa a marca de idiota, “afetada”, desonesta, rancorosa ou inconveniente. Essa gente devia ser também tratada sem nos deixarmos envolver…

O mundo daquela época era cordial. Não era de bom tom discriminar ostensivamente ou ser deseducado mas… “essa gente com problema devia ser observada com o devido cuidado”.

Ocorre que a tolerância imposta pelo regime da Constituição “ZUMBI” de 1988, permitiu aos esquisitos, aos corruptos, aos idiotas, galgarem cargos expressivos na estrutura do Estado brasileiro e ganhar destaque em nossa sociedade.

O nerdismo, o idiotismo, a mediocridade e a covardia, em determinado momento de nossa história, tornaram-se forças hegemônicas, ocupando cargos concursados, galgando nomeações em assessoria a outros idiotas bem postados, aparelhando a mídia idiotizada e…principalmente, tomando conta dos partidos políticos e canalizando votos de outros idiotas.

Nelson Rodrigues já havia identificado esse fenômeno, segundo ele iniciado a partir do momento que os idiotas perceberam-se maioria…

Felizmente, Nelson Rodrigues faleceu sem ter o desprazer de conhecer as supremas idiotias do “politicamente correto”…

A supremacia dos idiotas

O problema, no Brasil…é que, hoje, graças a essa supremacia dos idiotas, passamos a ser tutelados por “gente com problema” – idiotas, imbecis, malandros, hipócritas e psicopatas perigosos, todos postados no comando dos poderes da federação.

Essa cadeia da mediocridade afeta o balcão do cartório do juízo da comarca do interior, o centro acadêmico da fábrica de militontos em que se transformou a universidade pública com cotas para tudo, cargos importantes nos poderes da República e até a municipalidade perdida no rincão do país. Tudo está dominado pela supremacia do tipos problemáticos…

Assim, direitos do cidadão tornaram-se crimes, a inteligência passou a ser ameaça, a riqueza honesta virou desaforo, o crime atividade respeitável, a saúde pública desculpa e a justiça… válvula de escape para tiranetes.

Hoje, gente com problema decide, corrompe, investiga, acusa, fiscaliza, aplica e…principalmente, faz a lei.

Exemplos dos danos que essa gente imbecil causa ao país, não faltam. Basta ler o diário oficial ou ouvir a “Voz do Brasil” (programa este, certamente feito para gente com problema).

De fato, não há limites para a mediocridade. Jamais se poderá subestimar um imbecil (ele sempre se supera…). Por isso, não surpreende que Deputados estaduais tenham aprovado e pretendam tornar lei a chamada “Segunda sem Carne” no Estado de São Paulo. No parlamento paulista, até mesmo políticos inteligentes encontram-se envolvidos na névoa da idiotia institucional – difícil de evitar.

Se sancionado o projeto aprovado pelo governador Geraldo Alckmin, o cidadão paulista ficará privado de consumir proteína animal às segundas feiras e será proibido o fornecimento de carne em bares, restaurantes e refeitórios de órgãos públicos, todo primeiro dia útil da semana.

Virado à paulista afeta o clima do planeta

Um primor de inconstitucionalidade, constitucionalmente justificado pelos bem intencionados, aparentemente preocupados com a saúde alimentar do cidadão paulista… e com o clima do planeta.

A medida, dizem os pressurosos deputados neo-naturebas, é sustentada por estudos médicos, econômicos e climáticos – relacionados ao papel da proteína animal no organismo humano, no manejo da pecuária, nos impactos da flatulência e da aerofagia na atmosfera e no clima.

O instinto de imitação, herdado dos símios, de “copiar” padrões da “Europa-Maravilha”, com o apoio de celebridades do mundo Pop e comedores de sucrilhos (orgânicos), também integrou o cardápio lotado de ingredientes ecológicos e vegetarianos.

Lideranças importantes do mundo ambientalista surgiram para apoiar a lei “vegano por um dia” – incluso parlamentares com currículo respeitável nesse campo, próceres de uma convicção que remete à educação alimentar e ao convencimento político – JAMAIS, porém, á imposição legal.

Todo esse discurso pretensamente natureba e fortemente paternalista não condiz com a garantia democrática da autonomia privada do cidadão, cada vez mais limitada pelo Estado no Brasil.

Impor uma mudança de habito alimentar e interferir no mercado de alimentação e abastecimento – por meio de uma “lei de calendário”, configura inaceitável invasibilidade. Desequilibra o pluralismo democrático e fere o conceito de “bem comum”.

Afinal, o que seria um “bem comum”, ou na visão de Rousseau, uma “vontade geral” que justificaria tamanha interferência do Poder Público na livre iniciativa e na livre escolha do cidadão? A convicção de grupos de pressão “bem intencionados” em busca de um maior “equilíbrio ambiental” no planeta… às segundas feiras?

Esopo já preconizava que todo tirano exerce sua tirania buscando pretextos justos. O psicanalista Jorge Forbes também já ponderou que normas proibitivas de hábitos individuais geralmente decorrem da necessidade que muitos têm… de interferir na vida de outros. Vale dizer, leis como a da “segunda sem carne”, fazem a festa dos que “têm problema”.

Diria Freud, se estivesse vivo: “sintomático”…

Desastre jurídico e conceitual

Do ponto de vista jurídico, a medida é um desastre conceitual. Na relação material de custo-benefício, o “interesse público” em causa não resiste à notória assimetria do conflito de natureza conceitual e difusa em causa. Vale dizer: o entendimento de “interesse público” sobre os interesses da cada um, no campo das assimetrias envolvendo interesses difusos – intrinsecamente conflituosos – é igualmente difuso e intrinsecamente conflituoso.

Tendo por parâmetro o Estado Democrático de Direito e o direito á dignidade e às escolhas privadas (incluso as alimentares), o marco legal votado pelo parlamento paulista, não passa de entulho autoritário – imposição de grupos ideologicamente vocacionados que pretendem exercer o monopólio da virtude ambiental, ditando normas de conduta aos outros (no caso, á população paulista).

Todo cuidado é pouco quando se trata de delimitar autonomias e adicionar na grade de restrições legais, convicções plenas de invasibilidade que irão interferir no cardápio de restaurantes, no regime alimentar de funcionários públicos e na alimentação de crianças em idade escolar.

Choca, outrossim, constatar que essa norma estrambólica foi editada pela mesma assembleia legislativa que, não faz muito tempo, transformou em circo a CPI da Merenda Escolar – um crime de corrupção inaceitável que afetou a alimentação de milhões de crianças. Agora, pelo visto, o parlamento paulista resolveu vestir o cidadão com uma tanga de crochê e colocá-lo no centro do picadeiro, sem direito a picadinho (às segundas, bem entendido…).

Para essa “gente com problema” devemos mesmo ser hiposuficientes – uma gentalha que clama para ser cuidada por agentes públicos tão bem intencionados quanto incompetentes.

Não é novidade. Já foi assim com o desarmamento civil, com os juros bancários, com a burocracia cotidiana, com os serviços de saúde, o transporte público, o fisco, as normas de trânsito, etc…

Portanto, no caso da “Segunda Sem Carne”, pouco importa o hábito alimentar ou a escolha do cidadão. Algum imbecil, doravante, cuidará disso para todos nós… incluindo nossos irmãos que não comem carne também nos outros dias da semana, porque não têm dinheiro para comprar.

O virado a paulista tornou-se uma questão de saúde pública.

E não se surpreendam. É quase certo que o governador sancionará a obra prima dessa gente problemática.

Afinal, os idiotas votam…

 

afpp18Antonio Fernando Pinheiro Pedro é advogado (USP), jornalista e consultor ambiental. Sócio diretor do escritório Pinheiro Pedro Advogados. Integrante do Green Economy Task Force da Câmara de Comércio Internacional, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB e Vice-Presidente da Associação Paulista de Imprensa – API. É Editor-Chefe do Portal Ambiente Legal e responsável pelo blog The Eagle View.

 

Publicado originalmente em The Eagle View

 


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