Sustentabilidade: mito ou realidade?

Por Guilherme Crippa Ursaia*

sustentabilidade-guilherme-dOuvimos muito a respeito do tema Sustentabilidade, principalmente no meio empresarial, mas a pergunta que se faz é: o termo está sendo utilizado corretamente?

A resposta é negativa.

Erroneamente, investimentos são chamados “sustentáveis”, indústrias de papéis recebem prêmios de sustentabilidade por reciclar águas residuais, entre outras aberrações, distorcendo o seu real significado.

Para que se possa falar em sustentabilidade devemos atender a dois requisitos básicos:

  1. O primeiro diz respeito à retirada de energia e materiais da natureza;
  2. O segundo diz respeito ao retorno a natureza dos produtos e dos resíduos resultantes da utilização de energia e materiais.

Apenas para exemplificar, as reservas de carvão, petróleo, gás natural e urânio são limitadas. Em nossa escala de tempo elas não regeneram, podemos usá-las somente enquanto duram. Suas emissões de dióxido de carbono e dos resíduos radioativos não podem ser absorvidas pela natureza, assim, nenhuma destas fontes de energia pode satisfazer ambos os critérios de sustentabilidade.

Somente processos podem ser organizados de maneira sustentável, através de iniciativas transversais, como a gestão energética, de resíduos, hídrica, de emissões de gases de efeito estufa, de stakeholders, de governança corporativa e de tecnologia da informação verde ou Green IT.

Para que isto ocorra de maneira organizada dentro de uma empresa, surge a figura do CSO – Chief Sustainability Officer. Nas empresas nacionais, Diretor(a), Gerente ou Coordenador de Desenvolvimento Sustentável, que terão como atribuições informar claramente para a organização e seus stakeholders que este tema passará a ser uma competência estratégica para o negócio.

A adoção da estratégia de desenvolvimento sustentável por uma empresa vai muito além da implementação de standarts como as ISOs. Além disso, a maioria dos gerentes ou coordenadores de meio ambiente, saúde e segurança está “assumindo” responsabilidades neste segmento, sem, contudo, ostentar as qualidades necessárias, bem como deter uma visão holística do negócio. Existe a necessidade da criação de um cargo específico para este desiderato, com profissionais preparados para esta nova realidade.

Além disso, o contexto atual da maioria das empresas em relação ao vetor tempo é utilizar o prazo mais curto possível, ou seja, lucrar agora muitas vezes sem refletir em questões de perenidade e longo prazo. No vetor concentração de riquezas, busca-se sempre aplicar ao máximo o ganho em uma ponta sem a distribuição do impacto econômico positivo. Em relação ao vetor alavancagem, prioriza-se da mesma forma a apropriação de ativos de modo concentrado, desconsiderando a geração de ativos sociais compartilhados.

Se você for um gestor, necessário refletir sobre soluções considerando uma nova visão do retorno no “tempo”, novas estratégias de “descentralização” e programas que “alavanquem” valores e ativos sociais compartilhados, como por exemplo, alianças que ampliem o conceito de cadeia de fornecedores tradicionais e a combinação de ativos com os de outras empresas ou organizações.

Posso citar alguns casos de sucesso como: 3M, Basf, HP, DELL, IKEA, GE, Walmart, Klabin, empresas que têm o engajamento estratégico como fator de competitividade e que obtiveram impacto positivo em sua marca e imagem corporativa, maior conectividade com seus clientes e consumidores, redução de riscos decorrentes de multas e processos ambientais, índices mais elevados de satisfação de seus colaboradores, maior produtividade e incremento de possibilidades comerciais por atender aos critérios valorizados e exigidos por clientes e parceiros.

Interna corporis, o comprometimento do Conselho Executivo e da alta gerência de uma organização é vital e deve estar inserido em um novo contexto de gestão ambiental, englobando a reavaliação e o seu redesenho.

Destaco como temas principais a otimização energética, a correta gestão dos resíduos, incluindo a logística reversa, a redução da utilização de água, o cálculo da pegada ecológica, a inclusão da responsabilidade social corporativa (RSC), um plano de comunicação com o mercado (GRI, ISE, CDP ou GHG Protocol, PRI, Global Compact, Princípios do Equador, entre outros), a gestão dos stakeholders e a introdução do conceito de ecoeficiência no processo de produção.

O aperfeiçoamento do processo produtivo incluindo as exigências legais e preocupações ambientais, sem dúvida alguma torna-se menos oneroso, obtendo-se redução de gastos com matéria prima e desperdícios.

Na outra ponta, falando um pouco de incentivos fiscais, tramita desde 2005 o Projeto de Lei 5974, de autoria do Senador Waldeck Ornelas, que trata do Imposto de Renda Ecológico. Segundo o texto, as pessoas físicas e jurídicas poderão deduzir do imposto de renda devido, respectivamente, até 80% (oitenta por cento) e até 40% (quarenta por cento) dos valores efetivamente doados a entidades sem fins lucrativos, para aplicação em projetos destinados a promover o uso sustentável dos recursos naturais e a preservação do meio ambiente.

Já a Lei 8313/91 (Lei Rouanet), permite as pessoas físicas e jurídicas deduzirem do Imposto de Renda devido até 100% dos valores aplicados em projetos culturais, observando-se os limites de dedutibilidade deaté 6% do Imposto de renda devido (Pessoas Físicas) eaté 4% do Imposto de Renda devido (Pessoas Jurídicas), calculado à alíquota de 15%, nas empresas que apuram seu Imposto de Renda pelo Lucro Real.

Além deste incentivo da Lei Rouanet, as pessoas jurídicas com a apuração pelo lucro real poderão também utilizar, concomitantemente, dois outros incentivos, com dedução integral no imposto de renda, calculado na alíquota de 15%: a) Os Projetos desportivos, até 1% do IR, nos termos da Lei nº 11.438-06 e b) Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente, até 1% do IR, nos termos da Lei nº 8.069-90.

Ocorre que, segundo um estudo realizado por uma empresa de consultoria chamada Kantar Worldpanel (http://www.kantarworldpanel.com.br), para 74% das pessoas, as campanhas verdes não apresentam resultados efetivos. Desse total, 39% são mais radicais e não têm nenhuma crença nesse tipo de ação, enquanto 35% têm dificuldades para acreditar, ou seja, a maioria da população brasileira não confia nas ações de sustentabilidade anunciadas pelas empresas no País.

Apenas 26% dos entrevistados confiam e valorizam a mensagem transmitida e a pesquisa aponta que o maior fator causador de desconfiança nos consumidores é o fato de não visualisarem o resultado final da ação.

Não tenho a menor dúvida de que iniciativas legais serão determinantes para o setor empresarial realizar investimentos em gestão ambiental e modificar este quadro, porém, hoje, a incorporação da variável ambiental por parte de alguns setores industriais ainda se limita às exigências dos sistemas de fiscalização do poder público.

* Guilherme Crippa Ursaia é Advogado, Auditor Líder Ambiental – ISO 14001 pela Bureau Veritas, tendo trabalhado no Folkecenter for Renewable Energy, Solar Panels, na Dinamarca e Center for Alternative Technologies – CAT em Wales – UK. É membro da Comissão de Meio Ambiente e da Comissão de Energia da Ordem dos Advogados do Brasil – Subseções de Santa Catarina e São Paulo. Atualmente Gerencia as áreas de Sustentabilidade e de Novos Negócios do escritório Pinheiro Pedro Advogados.


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